Menos imediatismo, mais processos

Essa semana estou faladeira. Cabeça fervilhando após semanas de moda e outros acontecimentos e eu tô compartilhando bem mais minhas impressões nos stories do Instagram – em breve eu pretendo estender para micro vídeos do YouTube, agora com uma equipe, quem sabe a coisa engrena?
Bom, começamos nesse final de semana até o próximo, a Semana do Fashion Revolution, que é um movimento que propõe que questionemos às marcas quem fez as nossas roupas, criado com o objetivo de aumentar a conscientização sobre o verdadeiro custo da moda e seu impacto em todas as fases, desde o processo de produção até o consumo e pós consumo. 
Ano passado eu fui convidada do Fashion Revolution Salvador, esse ano não pude entrar nas programações por conta de viagens dos Workshops. Mas o assunto incitou um pensamento sobre a velocidade, ansiedade e imediatismo que venho presenciado com frequência, agora que ministro mais cursos e tenho me colocado mais nas redes sociais.

Questionando o modus operandi

Outro dia, lancei no workshop que eu praticamente não entrava em lojas que não fosse por trabalho, desde dezembro. Que meu desejo por compras reduziu drasticamente e como tenho achado tudo mais do mesmo. Uma pessoa questionou “Mas você não tem comprado nem uma blusinha?”. Entendi a pergunta, mas conseguem perceber como não comprar causa estranheza porque colocamos roupas numa posição de peças descartáveis e facilmente substituíveis?
As peças que eu mais gosto são antigas, e, claro, que sinto desejo por alguma coisa ou outra, até para atualizar o que já tenho. Mas comprar algo bom, de qualidade, seguindo minha cartela de cores, com bom caimento, seguindo meu estilo, de tecidos naturais, virou uma tarefa difícil.
E, sim, é até positivo dificultar! Mesmo quem anseia por uma mudança para melhor, precisa entender que existem o tempo das coisas. O nosso tempo. E não respeitamos isso. Queremos-tudo-já-agora-preciso-meu-deus-não-posso-viver-sem-não-dá-pra-esperar-tenho-festa-sábado-queria-já-sair-assim.
E aí que as coisas veem no tempo que elas precisam até para que possamos compreender mais sobre a gente, nossas escolhas, ponderar se aquilo é real necessidade ou pura crise de ansiedade, de vontade exarcebada de se destacar sem necessariamente trazer algum pensamento e atitudes de mudança.
Em moda, cada vez mais, a compreensão desse tempo tem sido destacada. Você tem uma festa no final de semana e PRECISA achar uma roupa para tal ocasião, sem eira nem beira, mas PRECISA. Sai correndo aos 48 do segundo tempo – porque, né, nessa urgência de fazer e acontecer nessa vida, quem se dispõe a ficar horas num shopping? – entra em várias lojas, ofegante, até que encontra um vestido mais ou menos que serve, vai ele mesmo, paga o valor e pronto, menos uma coisa na lista.

ana-soares-vestido-branco
Tirei foto com esse vestido e só isso me bastou. Não preciso tê-lo comigo <3

Mas talvez vai ser mais uma coisa que ficará sem uso dentro do armário, já que não existiu o fator planejamento para essa peça. Ou perceber que você já tinha tudo que precisava dentro do próprio armário, mas o anseio pela novidade e por uma vontade incontrolável de novidades.
Planejar é ganhar tempo, é fazer dessa busca por algo um momento pensado e dedicado, de entendimento de que o investimento precisa render com o que se tem no armário, valer novos usos, seguir o que se acredita, o seu estilo de vida, ser adequado aos seus anseios. Não merecemos o mais ou menos: somos muito especiais para abrigar qualquer coisa dentro das nossas coisas, dentro das nossas vidas, cobrindo nossos corpos. 🙂
O imediatismo e a vontade de resolver as coisas naquele momento só geram equívocos. Pensamos pouco sobre os prós e contras – não só de roupas, mas de tudo na vida –, da vontade emergencial por mudança, que muitas vezes acontecem quando precisam acontecer, não porque queremos que aconteça. Perceber e aceitar isso sem ficar doída é fundamental para uma vida com menos sofrimento e estresse.

Precisar não precisamos

Roupas, para serem feitas, demandam tempo. Estudo. Processos. Não deveriam ser padarias com pão quentinho a toda hora, ofertando vários nadas, peças sem expressão, sem diálogo, sem representatividade.
Mesmo que você não perceba, vestir-se é, sim, um ato político. Expressa de alguma forma, mesmo que involuntariamente, suas crenças, uma posição social e ideologias. Mostra o lado que você assume nessa engrenagem. A forma como você se coloca, pra si mesmo, nesse mundo.
Se essa engrenagem que gira numa velocidade absurda em busca de lucro deita em cima de leis trabalhistas questionáveis, meios de produção massacrante e desiguais, nos colocando como cabides e, mais ainda, mexendo com nossas inseguranças, vestir-se do resultado dessa engrenagem é, de certa forma, fazer parte dela. Continuar alimentando desigualdade, poluição, e um sistema que coloca mulheres como seres competitivos e fúteis.
Pausar o comprar por comprar me permite ter uma visão mais macro do que significa o meu poder como consumidora na mudança da sociedade, tornando claras as minhas crenças e me deixando menos refém de um sistema que nos joga uma carga de ansiedade e frustração fortíssimas.
Eu não pretendo mais girar rápido que nem essa roda. Já sofri de ansiedade pra ter algo que eu achava que precisava muito, já peguei ônibus só pra ir numa loja na PQP comprar o raio da peça que eu via todo mundo usar. A tal roupa foi usada apenas duas vezes. Duas únicas fucking vezes.

Quando me pedem para montar um look com bota vermelha, pra pegar inspiração de como usar a tendência da bota vermelha do momento, eu digo que não montarei. Acho lindo sapato vermelho, mas não preciso de uma bota nesse Rio de Janeiro onde só faz clima ameno três vezes ao ano. Ninguém precisa, inclusive, comprar algo que não sabe com o que coordenar – não é bacana levar mais dúvidas e questões pra dentro de casa, quando o mais coerente é pensar ANTES se aquele item vai dar liga com todos os outros, quantos looks vai render, em que ocasiões será usado…

Muito melhor se inspirar nas ideias com a cor vermelha e ir pro armário testar uma coordenação de cores complementares, com o verde. Aí você experimenta aquela sua camisa vermelha com uma calça verde musgo, ama e vai ser feliz mais colorida e menos monótona. 🙂
Obviamente eu não acordei pensando assim num belo dia de sol e, pliiiiim, virei o ser mais consciente do mundo, hahaha! Foram anos dando cabeçada, gastando dinheiro inutilmente, querendo acompanhar algo que já chega para nos fazer ficar em desvantagem eterna. Levei mais alguns anos para entrar no estágio de entendimento que estou agora sobre meu papel profissional, mais alguns outros períodos para ter o que me representa dentro do armário, e, agora, a compreensão que eu tô bem feliz de saber que estou criando muitos looks diferentes entre si apenas com o que já é meu. 🙂

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