O medo e o significado.

Eu cresci na cultura do medo. Não apenas por ser moradora do Rio de Janeiro e, assim, desde cedo conviver com uma violência naturalizada; por ter nascido mulher – e sabemos que existir como mulher é viver amedrontada a cada passo que se dá e ar que se respira –; como também por ter vindo como a primogênita da família, colocada numa redoma à prova de acontecimentos, tal qual Sidarta Gautama, o Buda.
Meus progenitores eram muito temerosos, foram pais bem jovens, inexperientes na vida, e, assim, jogaram uma carga muito grande nessa primeira filha. Eu sinceramente não os julgo mais, porque não imagino ainda a loucura e a responsa que é colocar seres humanos nesse mundão cão. Mas, por conta disso, e também por outros fatores, eu vivi infância e adolescência no meu apartamento. Vez ou outra saíamos, mas pra praia eu contava nos dedos de uma mão as vezes que fui, por exemplo. Outros tempos, meios de transporte, condições financeiras.
“Vó, me leva na festa do fulano?” “Cruzes, aquela rua é perigosa, tá doida?” “Posso ir ali com o pessoal da escola?” “Claro que não, a rua está cheia de marginais” “Queria ganhar um skate de natal” “Não, você vai cair, quebrar um osso e se machucar, Ana”.
Tudo era uma negativa, seguida de uma mensagem desencorajadora. Viver assim era muito frustrante, porque era como se não existisse uma confiança na minha capacidade de andar de skate sem me quebrar ou de acreditar que um dia eu poderia atravessar a rua sem temer que algo de ruim acontecesse.
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Só que a vida urge a sua existência, mesmo que no caos. E como enfrentar tanta coisa não-vivida, sem acreditar em si mesma, sem perceber seus potenciais e nem experenciado o que é de mais essencial em nossas trajetórias mundanas: cair, quebrar a cara, se estatelar, trocar, pertencer a grupos, tentar, falhar e tentar de novo até conseguir.
Soma-se a isso um bullying típico dos anos colegiais, e, bingo, temos assim uma mulher que, mesmo sabendo de todo seu potencial, não acreditava nele.
Até bem pouco tempo atrás eu era a pessoa que pedia opinião pra todo mundo, todo mundo MESMO, até desconhecidos. Pra tudo: pra roupa que eu tava vestindo, pros projetos que eu vislumbrava, das ideias que eu tinha, dos caras que eu tava saindo, tu-do. Extremamente insegura – por mais que minha aparência passe o contrário -, pouca vivência (passei boa parte da vida trabalhando e estudando que nem louca pra poder me sustentar, quase não tive tempo pra lazer), um receio de ficar sem grana no mês seguinte pra pagar as muitas contas (alô cariocas que sobrevivem em meio a aluguéis e despesas caríssimas), muita coisa me angustiava e, na real, muito disso era reflexo da insegurança que eu tinha no meu trabalho, na minha imagem, em mim quanto mulher.
Vivi com medo a vida toda. Medo de me separar e ninguém mais me amar. Medo de não dar conta das contas. Medo de perder os amigos. Medo de planejar algo e me frustrar. Medo de sair do apê velho e não conseguir nada melhor. Medo de postar um look e chover críticas.
Recebi os avisos dos astros e entidades que eu precisava acreditar em mim, que mesmo caindo, eu levantaria de boa. Recado veio, mas eu já sabia disso: após minha separação, eu notei como fui ao encontro a essa mulher forte que eu sempre fui, desde nova. Forte, sensível, amorosa.
Amigos se afastaram. O amor veio. Projetos novos estão sendo lançados. Tudo novo, de novo. E se….não, não posso mais pensar isso.
Muita novidade em tão pouco tempo, ainda mais para quem começou a viver agora, aos 39 anos, de maneira plena e mais serena. Às vezes fraquejo, mas nunca estive tão segura. Nunca antes o meu medo foi controlado dessa maneira; ainda o é sentido, fato, mas ele nunca mais vai me dominar. Não como antes.
À medida que fui vivendo, quebrando a cara e aprendendo que nem todo mundo tá preparado pra te ouvir e entender (viva a minha terapeuta!) – e isso é legítimo -, que se resguardar e aprender a se ouvir é importante, que eu não tinha motivos para não acreditar nas ferramentas que entrego como profissional, no meu texto, nas minhas ideias e muito menos em mim mesma, eu aprendi que se auto afirmar é NECESSÁRIO. Urgente. Vital.
Já me criticaram por isso, como se fosse errado eu querer me colocar mais forte nas mensagens. “O que vão pensar de você?”. O que vão pensar eu aprendi que não posso controlar, fato, e que preciso seguir a caravana mesmo com os cães latindo.
Agora, o que eu penso de mim, isso sim, eu posso melhorar, compreender, e é a coisa mais importante do mundo buscar esse significado. ❤️
Encorajem mais quem está ao seu lado. Menos críticas, mais compaixão. <3

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