Sobre julgamento e batalhas pessoais

Semana passada eu compartilhei um pouco da minha história no instagram, e fiquei bem feliz com a repercussão. Além da minha, li outras emocionantes.
A ideia era reforçar minhas escolhas políticas – porque como mulher e integrante de uma sociedade, estou despertando e entendendo que somos seres políticos –, mas pro blog eu quis trazer mais a discussão sobre julgamento.
Estamos o tempo todo julgando, é inerente. Desassociar-se desses pensamentos é bem difícil, mas o mais importante eu acredito que seja o que fazemos com eles e como recebemos esses pensamentos. Por exemplo, quando me dei conta que tudo que é feminino é subjugado, colocado como inferior, parei pra prestar mais atenção às minhas colocações sobre esse universo.
Como trabalho hoje com moda – na verdade me considero mais uma educadora, professora, do que necessariamente uma consultora de estilo – como ferramenta para tantas práticas voltadas ao autoconhecimento, vejo também o quanto essa associação do que visto + do meu ofício traz uma mensagem que não condiz com quem eu sou, essencialmente.
É comum me levarem em locais mais sofisticados, jantares em restaurantes bacanas, acreditando que eu não me refastelaria num boteco local ou apreciaria mais observar artesãs trabalhando que conhecer necessariamente grifes. Ou perguntam se minhas amigas não ficam intimidadas ao se arrumarem pra me encontrar (a resposta, é: elas estão cagando pra isso e eu também! hahaha). Ou já acreditam que o que é construído aqui veio com facilidade, inclusive o meu estilo, que muitas de vocês acompanharam a evolução, aliás.
E aí fiquei curiosa sobre as histórias de quem encontro. Das batalhas pessoais de cada uma de nós e o quanto isso pode dizer sobre nossas escolhas, hoje. E que não dá, de verdade, pra julgar ninguém por uma foto de instagram. Que muitas vezes um sorriso esconde passagens doloridas. Isso ajuda demais a humanizar mais o que é virtual. Mostra que não é pra acharmos que a grama do vizinho ficou verde rapidinho, e pronto. Que dá muito mais orgulho acompanhar quem compreende o lado do outro, que mesmo sem ter passado por situações similares, a vivência mostrou a importância da empatia.
Por isso, eu lhes apresento um pouco da minha história e de como aprendi que a humildade e a empatia são essenciais para que eu seja quem eu sou, no meu trabalho, na minha vida, nos meus ideais.
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Oi, eu sou a Ana. Quem me vê com roupa da moda e cabelinho estiloso, não imagina que morei por 13 anos na subida de uma favela, numa casa emprestada porque meus pais ficaram desempregados. Acordava com o Caveirão na porta, e algumas vezes eu subi minha rua, uma ladeira enorme, rastejando, pra não tomar tiro.
Achava que era uma vida muito difícil, não tinha dinheiro pra dar conta dos 8 ônibus que eu pegava por dia (4 pra ir e voltar da faculdade e mais 4 pra ir e voltar dos treinos como atleta de natação), por isso larguei o esporte para poder trabalhar e estudar. Achava que minha vida era dura, até começar meu emprego numa agência de comunicação voltada para o terceiro setor, ONGs e políticas públicas, há 17 anos. E foi lá que eu entendi o quão privilegiada eu era. Que minha cor de pele me permitia transitar em qualquer ambiente e de nunca ter sido revistada na subida do Andaraí. Que eu tive acesso ao estudo e a uma faculdade particular, com bolsa quase integral. Que tive o privilégio de, mesmo morando tão perto da comunidade, nunca sofrer com falta do que é básico em moradia. Tive uma família, pai e mãe que botaram comida na minha mesa. Que me deram cama, livros e teto.
Foi nesse trabalho que ouvi falar pela primeira vez sobre equidade de gêneros, feminismo, direitos LGBTQ (que na época era GLS), religiões afro-brasileiras. Desenvolvemos campanhas didáticas para projetos comunitários, direitos das prostitutas, revisão do sistema penitenciário, tráfico de mulheres, escravidão, materiais que orientavam portadores de HIV, hanseníase e tuberculose. Eu passava os dias tratando fotos da miséria humana. De pessoas que não esmoreciam e lutavam para terem seus direitos mais básicos assistidos. Líderes comunitários. Mulheres que não baixavam a cabeça pra um sistema.
Eu sou privilegiada porque eu vivo do que escolhi. Eu trabalho pra mim, me sustento sem ajuda de ninguém desde nova, pude estudar e viajar. E, reconhecendo a minha luta e a luta de tantas pessoas, é por isso que eu acredito que todas elas merecem ter também seu espaço no mundo, educação, trabalho digno e tratamento humanitário. 💜

E você: qual é a sua história? O que dela você extraiu para tentar julgar menos pela aparência?

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