Roupas que ferram nossa saúde

Eu tenho uma camiseta velha, detonadinha, que uso pra ficar em casa. Essa camiseta na verdade ganhou esse status porque desde sempre ela me veste mal: um dos meus ombros fica levantado porque ela vai escorregando pro outro, aí eu elevo sem sentir o ombro esquerdo para compensar e, quando vejo, estou mais torta do que a minha escoliose já garante.

Eu tenho problemas posturais desde criança, trabalho até hoje na fisioterapia o fortalecimento das costas (ombros muito pra frente) e, mais recentemente, do assoalho pélvico, que eu descobri que é a base de tudo e como ele interferia nesses meus problemas. Mas se eu tenho duas sessões por semana para me ajudar nisso, pra que usar uma camiseta (surrada, ainda por cima!), que só piora tudo de novo?

foto antiga do meu ombrinho que vocês já sabem que vivia mais alto

Há pouco tempo que me dei conta do quanto agredia meu corpo usando roupas não apenas desconfortáveis (que pinicavam, apertavam, de tecido quente), mas que prejudicavam muito minha saúde. Quem nunca ouviu a máxima “É isso mesmo, mulher sofreeee?“, para justificar as inúmeras agressões as quais submetemos nossos corpos? Químicas, injeções, cirurgias reparadoras, pêlos arrancados ou queimados, e roupas que incomodavam.

Algumas situações que passei

Casacos que limitavam os movimentos dos braços, sem poder me “abraçar” ou segurar a barra do metrô, deixando minha postura “caída”; bolsas de alça que eu carregava nos ombros e, com tanto peso que eu julgava ser necessário, elevavam mais meu ombro esquerdo, que já é mais alto naturalmente; saias e calças que apertavam na bexiga/útero e eu precisava abrir os botões para poder sentar e comer ou trabalhar; saias que impediam que eu caminhasse direito, encurtando as passadas; gancho da calça alto demais, apertando (e abafando!) a ppk; sutiãs, gente, SUTIÃS que não me deixavam respirar direito, com o diafragma! Fora as sapatilhas que forçavam bem onde tenho os joanetes, cortando a pele, deixando eles mais proeminentes, causando dores até na sola dos pés – com dor, pisando errado, os calcanhares cheios de bolhas; isso sem esquecer da época que os maxi colares estavam na moda, aqueles bem pesados, ou biquinis amarrados no pescoço, projetando a cabeça pra frente, ocasionando incômodo na cervical.

Sabemos ainda de calças apertadas demais impedindo a circulação, aumentando o risco de varizes, de problemas ginecológicos, problemas de pele com alergias e fricções, encurtamento de tendões por uso contínuo de salto alto, a lista é ENORME, mas enfiaram nas nossas cabeças que é normal sofrer pela estética, que mulher tem que andar desse jeito que fica mais elegante, que limitar os movimentos é bom para suavizá-los (!!), que roupa que veste bem só pra quem tem dinheiro, que a mesma roupa veste diversos corpos e ninguém mais considera ajustes ou algo sob medida.

Se antes eu culpava meu corpo por ser todo “bichado”, agora eu vejo o tempo e dinheiro que gastei para agredi-lo, coitado, e tento reverter esses danos. Aí eu achava que suava tanto que o problema eram as minhas glândulas e não o tecido horroroso de poliéster (ah, mas a cor da blusa tão linda…afff), que a pele dos meus pés era “fina” demais, que eu era uma errada mesmo (vai, Ana, ser gauche na vida), dos joanetes que eram hereditários, que mulher tinha mesmo muito corrimento, era normal, né? Já tive carne esponjosa (horrível, nem queiram saber), porque eu ouvi a vida todo como meus pés eram horrorosos, fui na podóloga ajeitar e a pessoa fez uma carnificina. 🙁

Fora as quedas que já tomei por usar uma sandália instável com calça ampla demais (e quase fui atropelada!), ou impedida de correr numa situação de perigo, pular as escadas para subir no ônibus porque a saia não deixava eu concluir o movimento (antes eu ria disso, agora acho bizarro), do calor que passava em eventos e ficava constrangida.

sapatilha que esmigalhava meus dedos (mas eu botava a culpa nos meus pés!)

A gente passa os dias se ajeitando, corrigindo, tapando ferida, correndo pra farmácia comprar band-aid, suspirando de alívio ao tomar banho e tirar tudo aquilo. AI, SABE.

Em nome da estética, de estar na moda, de ser relevante, feminina, desejada, sensual, estilosa – uma lista grande de desejos pelo outro, que não consideravam os MEUS desejos.

Dei um basta depois da Nina, porque não quero que ela tenha esse exemplo em casa – e também porque não desejo mais passar por isso. Não, não é uma blusinha inocente de ficar em casa, ela me desestabiliza, VAZA! Livrem-se sem pena porque nada paga a saúde da gente.

Cuidem da saúde de vocês, roupa causa problemas sérios de tensão muscular, dores, má postura, doenças ginecológicas e circulatórias. A culpa não é sua que você é isso ou aquilo, mas de uma indústria que massifica a produção, que não se preocupa em produzir peças com boa vestibilidade, investir em modelagem bem executada, fôrmas que acomodem bem os pés, costuras que não machuquem, aviamentos e tecidos de qualidade.

Roupa boa é que te deixa com postura ereta, movimentos livres, respirando com toda a capacidade pulmonar, caminhando percebendo o movimento completo, SORRINDO de felicidade e não de alívio.

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